Precisamos falar sobre a sua viscosidade sanguínea!

hemácias agrupadas que formam a viscosidade sanguínea

Apesar de décadas de tratamentos para abaixar o colesterol, regular os ritmos cardíacos e reduzir o sal e a gordura, a doença cardiovascular é ainda o assassino número um de adultos no mundo industrializado.  em sido associada a quase 300 fatores de risco independentes, entre eles o gênero masculino, LDL alto, HDL baixo, tabagismo, obesidade, resistência à insulina, estilo de vida sedentário e hipertensão.

A viscosidade sanguínea – uma medida da espessura e viscosidade do sangue de um indivíduo – é o fator comum entre todos esses. Ela é associada a cada um desses fatores de risco como colaboradora ou como efeito. Entender a viscosidade sanguínea e como ela contribui no desenvolvimento de placas ateroscleróticas e trombose, além de testar a sua presença e tratá-la, são passos essenciais para os nossos serviços como médicos de cuidados preventivos. Existem tratamentos naturais eficazes que podem alterar a viscosidade do sangue de forma segura, preservando a saúde e potencialmente salvando vidas.

A física da viscosidade sanguínea

Para entender a viscosidade sanguínea e como ela afeta as paredes arteriais, é necessário compreender a física envolvida nos fluidos.  O sangue não é da mesma espessura e viscosidade o tempo todo. Enquanto a água em um lago não é mais espessa que aquela que corre em um riacho, o sangue muda sua espessura dependendo da velocidade. Ele é mais espesso onde corre mais lentamente.

O efeito de viscosidade sanguínea explica porque as placas ateroscleróticas são encontradas quase exclusivamente nas bifurcações das artérias grandes no pescoço, em volta do coração e nas grandes artérias das pernas. Estas bifurcações criam “redemoinhos”, lugares onde o sangue se torna turbulento. A viscosidade do sangue assim determina não só o quão duro o coração tem que trabalhar para fazer o sangue circular, mas também o nível de ferimento físico que o sangue pode causar nas paredes internas das artérias. O sangue viscoso tem uma qualidade abrasiva que danifica o endotélio, levando à inflamação. As placas são formadas para proteger estas áreas delicadas do constante espancamento do sangue erosivo e viscoso.

Fatores que afetam a viscosidade sanguínea

A viscosidade sanguínea é determinada diretamente por quatro fatores primários:

hematócrito;

deformabilidade de hemácias;

viscosidade plasmática;

sedimentação/agregação de hemácias.

Hematócrito

O efeito do hematócrito faz sentido intuitivo: quanto mais células sanguíneas se tem, mais grosso será o sangue.

Deformabilidade das hemácias

Não tão óbvio é o papel da deformabilidade de eritrócitos. Isso se refere à habilidade das hemácias a curvarem-se e dobrarem-se para conseguir passar pelas passagens estreitas dos capilares. A deformabilidade das hemácias é inversamente correlacionada com a viscosidade sanguínea, significando que quanto mais deformáveis são as hemácias, menos viscoso será o sangue. Hemácias jovens são mais deformáveis do que hemácias mais velhas. A deformabilidade dos eritrócitos é, depois do hematócrito, o segundo mais importante fator a determinar a viscosidade sanguínea.

Viscosidade sanguínea

A viscosidade sanguínea se refere à viscosidade da matriz não celular do sangue. Um determinante importante da viscosidade plasmática é o estado da hidratação, e há muitos outros. Uma pesquisa publicada no jornal Aviation, Space, and Environmental Medicine demonstrou que a desidratação aumenta a viscosidade sanguínea sistólica em 9,3% e a viscosidade sanguínea diastólica em 12,5%.

Sedimentação / Agregação das hemácias

A sedimentação/agregação de hemácias é a tendência das hemácias a serem atraídas umas para as outras e se grudarem. Há vários fatores que podem aumentar a sedimentação e a agregação. A viscosidade sanguínea se correlaciona diretamente com a agregação de hemácias e a viscosidade plasmática.

As diferenças entre homens e mulheres

Está bem estabelecido que os homens de qualquer idade têm risco mais elevado de terem eventos cardiovasculares do que as mulheres que ainda não entraram na menopausa.  Pensava-se que o fato do risco da mulher aumentar significativamente após a menopausa era devido ao nível decrescente de estrógeno, com perda concomitante de seus efeitos protetores. Os estudos mostram que as mulheres que tiveram histerectomias (menopausas cirúrgicas) encontram-se em risco aumentado para doença cardiovascular – não importa se os seus ovários foram preservados intactos. Mesmo as mulheres mais jovens que tiveram histerectomias e retiveram os seus ovários, não tendo, portanto, mudança no estrógeno, continuam em risco aumentado. Por que isso acontece?

Lembre-se dos 4 determinantes primários da viscosidade  sanguínea: hematócrito, deformabilidade das hemácias, agregação das hemácias e viscosidade. Todos os quatro são altamente afetados pela perda sanguínea mensal da mulher. O efeito no hematócrito é óbvio.  A deformabilidade das hemácias pode ser menos. As hemácias têm vida útil de aproximadamente 100 a 120 dias, e as hemácias jovens são mais flexíveis e deformáveis do que as mais velhas. Por causa do sangramento mensal, as mulheres fabricam mais células sanguíneas novas do que os homens. O sangue delas contém aproximadamente 80% mais células sanguíneas jovens do que o dos homens. As hemácias mais velhas também são mais prováveis a agregarem-se do que as hemácias mais jovens. Além disso, elas são mais frágeis do que as células mais jovens e mais prováveis a romperem-se, liberando hemoglobina no plasma. A hemoglobina livre no plasma se liga com óxido nítrico, reduzindo a habilidade do óxido nítrico a realizar as suas funções como vasodilatação e inibição de agregação de plaquetas.

Viscosidade sanguínea e doença cardiovascular

Um número crescente de estudos aponta para o papel da viscosidade sanguínea nas doenças cardiovasculares. Na década de 1990, o Estudo de Artérias de Edinburgh observou 4.860 homens com idades entre 45 e 59 anos por cinco anos e demonstrou que 20% dos indivíduos com a viscosidade mais alta tinham 55% dos principais eventos cardiovasculares.  Somente 4% dos que tinham baixa viscosidade tiveram qualquer evento cardiovascular significante.

Outro estudo acompanhou 331 homens recentemente diagnosticados com hipertensão por até 12 anos. Os pacientes foram agrupados em três categorias por nível de viscosidade sanguínea: alto, médio e baixo. Os indivíduos que tinham o teste de viscosidade mais alto tinham três vezes mais probabilidade de ter eventos cardiovasculares do que os indivíduos que tinham o teste de  viscosidade mais baixa, mesmo que todos fossem hipertensos.

Viscosidade sanguínea e diabetes

Já foi demonstrado por vários pesquisadores que os diabéticos têm viscosidade sanguínea elevada. Sabe-se também que a deformabilidade de células vermelhas e a osmolaridade do sangue – ambos afetados pela glicose sanguínea descontrolada – mediam as mudanças de viscosidade sanguínea e o início de doença de pequenos vasos.

Os diabéticos têm uma proporção mais alta de células vermelhas que são relativamente não deformáveis e que devem passar através de relativamente longos e estreitos capilares para transportar O2 e nutrientes para as células. Os capilares podem ser menores que o diâmetro de eritrócitos, resultando em danos às paredes dos capilares.

Esses danos são exacerbados dramaticamente quando a deformabilidade do eritrócito é debilitada. Cegueira, insuficiência renal e isquemia da perna são os primeiros problemas a aparecer porque os órgãos associados são os mais dependentes na microperfusão para seu funcionamento.

Viscosidade sanguínea e declínio cognitivo

Formas múltiplas de declínio cognitivo, incluindo a demência e a doença de Alzheimer, são afetadas pela viscosidade sanguínea aumentada. Em um relatório de 2010 do Estudo de Artérias Edinburgh, a viscosidade sanguínea foi demonstrada como preditora do declínio cognitivo em 452 pacientes idosos em um período de quatro. A viscosidade sanguínea é um determinante importante do fluxo circulatório do sangue e foi demonstrado a ser significantemente ligada à função cognitiva.

Outras condições associadas com a viscosidade sanguínea elevada

A viscosidade sanguínea aumentada é associada com uma gama surpreendente de condições. Nas mulheres que desenvolvem a pré-eclâmpsia na gestação, a viscosidade sanguínea aumenta aproximadamente seis semanas antes do surgimento dos sintomas clínicos.

A viscosidade do sangue é também associada com cesarianas, devido ao sofrimento e a morte fetal. Outra associação com o aumento da viscosidade é a oclusão da veia da retina e o glaucoma. O Dr. Kenneth R. Kensey, importante pesquisador neste campo, até disse que todas as patologias oftalmológicas podem ser ligadas à viscosidade sanguínea elevada.  Outras condições que têm sido ligadas à viscosidade sanguínea incluem enxaquecas, síndrome de Reynaud, gota, cirrose e artrite reumatoide.

Testando a viscosidade sanguínea

O teste de viscosidade do soro ou plasma é a única medida com utilidade clínica limitada que não cobre o hematócrito, a deformabilidade de células sanguíneas ou fatores que aumentam a agregação de células sanguíneas vermelhas.

Já a medição da viscosidade do sangue total, está disponível em poucos laboratórios de referência. O mais novo e avançado teste usa um viscômetro de escaneamento de tubo capilar automatizado, que é capaz de medir a viscosidade no âmbito completo. Porém, ainda não está disponível comercialmente.

   

 

    

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