Porque cozinhar nos torna humanos?

Segundo o pai da antropologia moderna, que escreveu o livro “O cru e o cozido”, em 1960, Lévis-Strauss

“A culinária não apenas marca a transição da natureza para a cultura, mas através dela e por meio dela, o estado humano pode ser definido com todos esses atributos”

Ele entendia que os humanos cozinham seus alimentos por motivos culturais e psicológicos, e não por alguma imposição biológica ou fisiológica.

Esse é o mesmo pensamento do antropologista, Edmund Leach:

“As pessoas não precisam cozinhar a comida, fazem-no por razões simbólicas para mostrar que são homens e não animais”.

Surpreendentemente novos estudos tem mostrado que o alimento cozido torna o alimento mais fácil de digerir. 

Ou seja, na pratica de cozinhar, os humanos criam mais tempo para atividades culturais e mais energia para gerar um cérebro mais poderoso e maior.

Segundo o primatologista Richard Wrangham, cozinhar é uma atividade humana universal, na qual usar o fogo para preparar os nossos alimentos nos leva à um comportamento unicamente humano, incluindo maior cooperação, sociabilidade e divisão de trabalhos entre homens (que caçam) e mulheres (que cozinham), aumentando a ligação entre ambos os sexos.

Além disso, alimentos cozidos fornecem aos humanos mais energia, apesar de termos um trato digestivo, boca e dentes menores, mas um cérebro maior. Isso faz com que tenhamos menor gasto de energia na digestão.

Aliás, foi o cozimento da carne, que fez com que o cérebro humano triplicasse de tamanho, ou seja, era inicialmente equivalente a 500 mm3 e passou a 1.500 mm3, permitindoque o homem passasse a dominar todas as espécies na escala animal. Aumentou a inteligência, a capacidade de criar armas e se defender.

Outro ponto é que alimentos crus levam mais tempo para serem mastigados.

Resumindo: o fogo, para o preparo dos alimentos, permite que tenhamos uma digestão melhor dos alimentos.

Carne cozida

Há 4 razões tornam a carne cozida mais fácil de se digerir:

  1. A carne contém diversos tipos de tecido conectivo, tendões, ligamentos e o processo de cozimento derrete essas fibras, facilitando a sua digestão.

As exceções de carnes cruas boas de digerir, devem ser as cortadas em pequenos pedaços como o carpaccio ou o steak tartare.

  • Com o aquecimento da carne, o colágeno derrete, relaxando as fibras permitindo um aumento de superfície de contato do suco gástrico. Assim ocorre digestão mais fácil, pois a enzima tripsina passa a ter efeito 4 vezes maior do que na carne crua.
  • O cozimento reduz o tamanho das partículas, assim como o cortar, esmagar ou moer, o que facilita a sua digestão.
  • Adicionar sal, marinar ou desidratar, promovem desnaturação das proteínas, o que também torna a carne mais fácil de se digerir.

Acredita-se que o tamanho do cérebro dos humanos é proporcionalmente maior do que os outros mamíferos.

Quando comparado com os cérebros dos chipanzés, o cérebro humano é cerca de 3 vezes maior.

Por outro lado, o nosso trato digestivo é menor do que se esperaria para um primata com tamanho de corpo semelhante ao nosso.

Termos um intestino menor, garante que gastemos menos energia na digestão, sobrando energia para o desenvolvimento e função cerebral.

Avaliação das dietas de alimentos crus

Segundo publicação no Annals of Nutrition and Metabolism, aonde avaliaram estudo conduzido em 1990, e publicado em 1999 com 500 pessoas entre homens e mulheres, que consumiram dieta de alimentos crus por longo tempo (+/- 4 anos).

Consumiram nesse período, frutas frescas e secas, vegetais fermentados, nuts, mel e óleos.

No final, observou-se redução de índice de massa corpórea, de peso, abaixo da média para a faixa etária.

Além de relatarem fome nesse período, perderam a robustez física, necessária para atividades de coleta.

Cerca de 1/3 das mulheres abaixo de 45 anos, tiveram amenorreia. Os homens reportaram diminuição da libido.

Ou seja, a dieta de alimentos crus, não garantiu um aporte adequado de energia, assim como perda de peso.

Observou-se também redução de massa óssea na maioria das pessoas, baixos níveis de vitamina B12, HDL colesterol (bom colesterol) e homocisteína elevada.

Cozimento e digestão

– Amido, alimentos fibrosos e a maioria das carnes requerem cozimento para digestão.

– Vegetais demoram mais para serem digeridos do que amidos e carnes. Além disso demoram mais tempo para deixarem o estômago.

O cozimento quebra essas fibras vegetais em elementos mais fáceis de serem digeridos.

E quando estão no intestino, se tornam alimento para bactérias, na forma de ácidos graxos de cadeia curta.

Isso é importante para a boa ecologia intestinal.

Referências bibliográficas:

– Catching Fire: How cooking made us human. Richard Wrangham, 2009, page 44; 58; 79-80.

– Ann Nutr Metab. 1999;43(2):69-79

– J Nutr. 2005 Oct; 135(10):2372-8

– Curr Anthropol. 1999 Dec;40(5):567-594

– Curr Anthropol. 1999;36(21)

– Comp Biochem Physiol A Mol Integr Physiol, 2007 Nov; 148(3):651-6

– Journal of The Science of Food and Agriculture. 2004, June;84(8):863-869

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