Condenado nas últimas décadas como inimigo público número um do coração, o colesterol vem sendo objeto de controvérsias entre os pesquisadores.
A comunidade médica mundial está dividida e o pomo da discórdia é a redução dos valores de referência para os níveis de colesterol sangüíneo. Os que a defendem alegam haver relação direta entre colesterol e risco cardíaco. Pesos pesados da medicina, porém, vêem na medida apenas um eficiente lobby dos laboratórios para aumentar em alguns milhões o número de usuários de drogas redutoras de colesterol, como as estatinas. É o que pensam, por exemplo, o presidente do Instituto Americano do Estresse, Paul Rosch, e o cientista Uffe Ravnskov, presidente da THINCS, organização de pesquisa sem fins lucrativos.
Argumentos não faltam para fundamentar as suspeitas. Alguns estudos apontam mortalidade até cinco vezes maior entre as mulheres com baixos níveis de colesterol. Também para idosos de ambos os sexos, o colesterol elevado mostra-se benéfico, ao proteger contra doenças virais e bacterianas. E, ao contrário do que ocorre nos Estados Unidos, países como Rússia, Canadá e Suécia consideram o baixo colesterol uma ameaça pior à saúde cardiovascular.
De verdade, sabe-se que inexiste relação direta entre colesterol elevado e risco cardíaco. Com freqüência, os dois aparecem associados, mas não há provas consistentes de que o primeiro seja um desencadeador das cardiopatias – o mais provável é que ele funcione como um sinal de que outro distúrbio mais grave está se instalando. Isso basta para que mereça atenção e acompanhamento, mas não justifica um bombardeio por drogas de benefícios duvidosos. Entre as funções que desempenha no organismo, o colesterol tem a importante missão de “impermeabilizar” as células, principalmente do cérebro e do sistema nervoso. Ele também funciona como base para a metabolização de algumas substâncias indispensáveis, como os ácidos biliares, alguns hormônios sexuais e os hormônios adrenais, que preparam o organismo para lidar com situações de estresse e inflamações. E, quando há baixas reservas de vitaminas e minerais, o colesterol age como antioxidante.
Nada disso significa que seja recomendável aumentar o colesterol circulante no organismo, mesmo porque sua produção é regulada naturalmente pelo fígado. O que esses dados pedem, sim, é maior serenidade diante de alterações nas taxas de colesterol. Cada caso merece um estudo particularizado e minucioso. Afinal, na boa medicina, não há modelos que sirvam para todos.